Máscara neolítica - 7.000 a.C.
A mentira é tão antiga quanto o desejo de alcançar e manter o poder. Os dois se retroalimentam em motoperpétuo. A sociedade se compraz na falácia, na fofoca, no ti-ti-ti. A máscara e o personagem seduzem os incautos. De fato, a realidade é cruel para muitos e fugir dela é uma necessidade. Na alienação, o hedonismo grita por pão e circo.
Dia destes sentei em frente ao iluminado retângulo alienante e busquei pela verdade nos conteúdos da TV aberta. Encontrei vestígios num telejornal de prestígio ancorado por um publicitário que fazia caras e bocas para chamar as reportagens. Nada de novo. A realidade numa versão leviana, superficial, adornada pela estética visual cinematográfica. Noutro canal, (de esgoto noticioso) o apresentador vociferava contra os direitos humanos e pregava a pena de morte com o dedo em riste. Parecia candidato político.
Zap! Noutro canal, algo não me cheirou bem. Um repórter se ufanava por ter conseguido uma matéria exclusiva sobre um fato “sensacional”! O banal flagrante de um tiroteio entre policiais e traficantes. Imediatamente recordei de um costume terrível das chefias de reportagem, que na falta de assunto, ligavam para algum batalhão da PM e arranjavam uma operação às pressas, na favela mais próxima. Sempre odiei esta farsa e nunca aceitei este circo, o que me valeu fama de “derrubador de pautas”.
Adulteração dos fatos? Pior! Fabricação de notícias! Tiroteios são fáceis de serem simulados e os policiais nem precisam prestar conta das munições utilizadas no suposto bang-bang. O som das rajadas de fuzil pode facilmente ser adicionado à narrativa na hora da edição ou até mesmo durante a gravação da reportagem. Basta um smartphone com internet. No Youtube existem milhares de vídeos demonstrativos de fuzis. É só encontrar um, colar o autofalante do telefone no microfone e ”dar play”. Touf ,touf, touf, touf, touf... “Tiros... Tiros... tiros... Abaixa aí... É fuzil... HK 47... Kalashnikov... russo... o mesmo do filme Senhor das Armas!”, grita o ofegante repórter novato e muito bem intencionado na carreira de mentiras. Para os desavisados, iria parecer bem real! Que jornalista não conhece algum colega capaz deste simulacro para garantir um “furo” e turbinar telejornais trash news, onde o conteúdo é escravo da pesquisa instantânea de audiência coletada através de amostragens pífias, secretas e nunca fiscalizadas.
A cada troca de canal, novas sentenças falsas, afirmativas levianas, ilusões. O intervalo comercial é um show de propagandas enganosas. O que seria do marketing sem o “caô”. A presepada. Alguém acredita em desodorante que proteja 24 horas? Falar de graça ao celular? Instituições bancárias que garantem o futuro? Lorotas sem fim! E tem gente que acredita. A ingenuidade é terra fértil pra mentira.
Zapeei novamente e fui parar num programa de auditório. O cantor se esforçava pra impressionar o público num evidente playback. A encenação do instrumentista no palco para dublar o som gravado em estúdio beirava o ridículo. Todos os artistas simulavam performances. E este recurso ainda é amplamente utilizado.
As novelinhas então... Não vale a pena ver de novo os mesmos estereótipos de sempre. A megera, o bufão, o pilantra, o homoafetivo, a prostituta, o mocinho narcisista...
Tanta gente adora mentira. Tanto, que acredita nela. Falsários que até ensinam aos filhos que mentir é preciso. Um dia destes, um estudante de jornalismo me disse que não via vantagem em ser honesto e falar a verdade. Minha primeira reação foi parabenizá-lo pela revelação contraditória. Ele acabara de assumir uma verdade escondida ou negada pela maioria. Convidei o “corajoso” e o restante da turma para a seguinte reflexão: Quando você adoece, gostaria de ser atendido por um falso médico? Quando o carro estraga, você pede ajuda para um mecânico fajuto? Quando você vai ao restaurante, suportaria saber que aquele arroz de brócolis é reaproveitamento de comida dos dias anteriores? Imagine morar num edifício projetado com cálculos mentirosos, custos superfaturados, material de má qualidade. A tragédia na Boate Kiss, em Santa Maria, os desabamentos dos edifícios Palace II e Liberdade no Rio de Janeiro; ou o recente prédio do Magazine Torra-Torra, em São Paulo. Imperícia, imprudência, negligência. Seja qual for a causa principal, a mentira estará sempre por trás. Quantos fatos tristes se repetem por causa da falsidade?
As leis que regem a natureza tem a verdade como essência e a ela devemos voltar.
"Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará"- João 8:32
Marcelo coelho é jornalista e músico. Nasceu em Santa Maria mas cresceu e pegou gosto pelas artes e a comunicação em Pedro Osório. Há 20 anos vive no Rio de Janeiro onde possui uma produtora de conteúdos audiovisuais que presta serviços para vários meios de comunicação.
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