Agora havia um silêncio. Ou “o”
silêncio. Seria uma coisa só. Única, não divisível, apenas interrompida
esporadicamente pelo som. Todos os sons. Barulho. E agora era só o teclado.
Mentira. Se parasse e ouvisse, ouviria o
mundo rangendo seus dentes, suas articulações cansadas. O movimento e o som.
Mas o ouvido era treinado. Treinado para
não ouvir longe. Nem dentro. Não ouvir. Então era o silêncio. Como seria
morrer?
Ladainhas e murmúrios? Lamentos e
choro? Graves vozes te condenando a um
inferno eterno? Ou só o grande silêncio. O movimento sem som. O olho sem luz. O
grande nada?
O café e o estômago. Muita água do
chimarrão. Quente. O café nem tanto. Fraco e sem graça. A bolacha d’água
também. Ausência de gosto.
O livro ainda por acabar. Ou começar
novamente. Um livro acaba? Ou reverbera mil outras coisas? Acaba?
O relógio ali. No canto direito da tela,
18:22. A sala vazia e a grande mesa. E o texto se tecendo, procriando letras e
ideias no esforço do vazio. Buscar
palavras no ar. Caça-las, manipulá-las. Ou deixar que elas façam isso no corpo.
Deixar que elas criem o próprio corpo do texto, a carne do texto.
Um gole no café ,agora, ainda mais frio.
E doce. O chimarrão estava melhor. Quente.
O que há é uma espera. Sempre há uma
espera. Mesmo que não estejamos conscientes disso. Esperamos. Sempre.
Somos a própria espera. E nela o corpo
padece. A carne do corpo falece. E encontra? Eis a dúvida. Encontrar o quê? Nem
sabemos o que esperamos. Eu não sei.
Mas espero com os outros. Questão de
socialização. Se todos olham para cima, lá vão meus olhos também. Sorrimos
todos esperando. Isso nos torna mais felizes. A felicidade é importante. Até
mesmo em pequenas dozes. Mas o texto não pretende ser pessimista ou lamurioso.
Pretende ser apenas texto. Texto que cresce entre estes interstícios de vazio.
Palavra por palavra. Meio Frankstein. Texto monstro.
O estômago agora doí e revoltado divulga
os sons de sua dor. Comer. Devorar. O corpo possui essa necessidade de
destruição de outro corpo. Assimilação de outro corpo no próprio corpo. O corpo
não sobrevive sem a morte. A vida do corpo depende da morte de outro corpo
qualquer. Animal ou vegetal. Vida e morte. E muitos dentes. Mastigar a vida até
a morte.
Ronie Von Rosa Martins
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