Escrever?

"Escreve-se sempre para dar a vida, para liberar a vida aí onde ela está aprisionada, para traçar linhas de fuga" (Gilles Deleuze)

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Revéillon Déjà Vu



Às vezes fico pensando em como é pensar;
Vai-se ao longe numa pequena e distante viagem;
Agora, por exemplo, pensava que mais um ano (ou menos) passou.
Alguns de nossos problemas tornaram a repetir-se. Outros até aumentaram...
Mas coisas muito boas também aconteceram; Afinal, vive-se para quê?
É nisso que dá o pensar. Voltar no tempo e tentar repetir o que deu certo.
Aí vem o final de 2013... Não como o de 2000 com certeza, no “bug” do milênio;
Na virada do século, mesmo que ela só tenha acontecido em 2001, é claro...
Mas isso é o tal de Ano Velho.
Pois já no Ano Novo, não se quer uma vida nova e, sim, a mesma com reparos pontuais                               em nossos principais defeitos de fabricação...
Um novo pensar.
Esses dias, por exemplo, tomei um rico de um banho de rio (na sombra!).
Foi simples e prazeroso, como só as coisas simples podem ser.
Porém, outros seres, os não-tão-pensantes-assim, haviam deixado para trás, desde fraldas                        até garrafas de vidro e pacotes de bolacha e picolé. Lixo... Estou falando das pessoas...
São do tipo... Vidas velhas, entende?
 Aí fico eu, pensando e viajando longe, até onde as pessoas não precisariam nem serem educadas; tipo: o vivente já nasceria sabendo... Motoristas respeitariam os pedestres nas esquinas, as pessoas cuidando de suas próprias vidas e, ao mesmo tempo, colaborando       para com as outras, sem qualquer tipo de interesse e distinção; dando preferência aos      idosos, crianças e mulheres. Tratando de suas próprias vidas. Só isso.
Que tenhamos todos, um Ano Novo em nossas novas vidas velhas; buscando sentir-se bem.
O pensar é o sentir e vice-versa. Sinta até onde o leva seu pensar.
E agradeça ainda estar vivo por aí, peleando, matando seus leões de estimação todos os dias;
Pois escrevo para você, que vive a cada dia duvidando de si mesmo, desafiando-se; arriscando sua cabeça pelas coisas em que acredita; fazendo, ao invés de olhar os outros fazerem.
Que 2014 seja o que tiver que ser! Que façamos as coisas acontecerem para nós.
Que pensemos e sentimos.
Não necessariamente nessa ordem.
E, quando tudo tornar a repetir-se;
Saibamos que algo de errado está acontecendo;
À não ser que só as coisas boas é que se repetem;
Aí meu irmão...
É um abraço.
Venha 2014.
Vou lhe usar.
Se você deixar.
Pense e sinta.
Pois uns não pensam direito.
E outros jamais serão.
Que em 2014, você seja então.
Apenas isso.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

NUNUNHA CABEÇÃO







Cabeção. Óculos enormes. Cabelos desgrenhados. Olhos que consumiam o visto. Braços magros e mãos finas. Dedos compridos de lambuzar nos textos e chupar o dedo.
Ele não viu a menina que entrou na biblioteca. Toda a biblioteca viu. Simplesmente linda. Mas ele não viu. Cravado estava no livro. Plantado de corpo e alma no seu delírio de leitor fanático.
A professora Ritinha havia inclusive feito algumas observações sobre o comportamento anormal do menino, “Esse guri só quer saber de ler. Não faz mais nada, só lê.” E esse “só ler” era dito com uma espécie de frustração. Ao que a diretora da escola respondia que “se ele está indo bem nas outras matérias...” e estava. Era uma espécie de referência na sala de aula. Sabia dos deuses gregos, romanos e nórdicos pelos gibis, conhecia as regiões e costumes de outros povos lendo as revistas geográficas do pai, entendia de física e química porque lia um almanaque antigo de ciências que ganhara de um professor amigo, mas sua predileção eram os romances. Lia tudo. Tudo.
Mas era feio. Era esquisito. As crianças o procuravam só quando precisavam ajuda em alguma disciplina. De resto era Nununha Cabeção pra lá, um tapão na orelha, Nununha Cabeção pra cá, um chute nas canelas e um empurrão. Não reclamava.
O nome era Francisco Nunes, mas herdara o apelido de Nununha do avô, “seu” Nununha, o velho da banca da esquina. Diziam até que essa mania de “comer” letras vinha do avô. Uma maldição.
Enquanto os amigos jogavam bola e exercitavam o corpo, Nununha, de mirrado corpo exercitava o cérebro e a imaginação.
E tudo era quixotesco. Dramas. Comedias, tragédias.
Mas não viu a menina. E ela o viu. Era trabalho de escola. Pesquisa sobre um escritor. Ela era de outra turma. Mais adiantada.
Ouvira falar do Nununha. Entre troça, espanto e admiração, era propagada a inteligência e a bizarrice do menino.
As vezes no recreio, passava horas acompanhando as formigas carregadeiras, olhar atento, quase tentando uma comunicação que fosse capaz de resolver as dúvidas que lhe vinha na cabeça. “Por que a fila”, “como tanto peso?” “o que diziam uma para as outras quando se encontrava?” e assim ficava até o sino tocar ou alguém lhe dar um empurrão e dizer que Acabara o recreio.
Levantava do chão e ia  para a sala. Não via ninguém. Sua classe era seu ninho. Nem o barulho dos colegas conseguia irritá-lo. Quando uma bolinha de papel acertou seu olho teve vontade de chorar, mas logo lembrou de outras histórias, de heróis que eram atingidos por balas, flechas, e pedras e resistiam bravamente. Monstros haviam em todos os lugares. Acionou rapidamente o botão que trancava as escotilhas da nave e fugiu daquele planeta hostil. Flash Gordon.
Ela era bonita. E o namorado a observava sorrindo da janela. A menina sentou em frente ao herói. Sansão prestes a sofrer nas mãos de Dalila. “Oi?” e o inferno daquele dia em diante começara. Seus olhos de traça pela primeira vez avistaram algo que merecia atenção além dos livros e letras. Ela sorriu, disse que ele era bonito, que era interessante. Que queria conhecê-lo melhor. Que seu nome era Estela. “Ele pensou Estrela.” E um coração antes de papel e tinta preta agora batia assustado e  estranhamente afoito. A mão dela sobre a sua. Quente, pulsante. Galáxias que se tocavam. Queria chorar. Pela primeira vez quis chorar. Ela levantou-o pelo braço, inocente. Ingênuo. O sorriso do outro na janela. Nenhuma leitura conseguia avisá-lo neste momento do que o aguardava. Ao transpor a porta. Toda a escola. Dois lados. Um corredor. Gritos e insultos. Pontas-pé, tapas, empurrões, ofensas, gargalhadas e os olhos dele sem saber o que acontecia. Procuravam a menina, os óculos no chão. Quebrados, chutados, pisoteados. A pasta, os livros. Destruição. No fundo do corredor, abraçados Estela e o namorado. Risadas. Um tombo. Uma vergonha. Uma vontade de morte.
Aos trinta e dois estava preso. Aos quarenta e dois enterrado no cemitério da família.
Ainda hoje quando alguns passavam pelo local lembravam com horror do Nununha Cabeção, o menino que pusera fogo na escola.
Chamas enormes. Quentes. Infernais. A cidade correndo como as formigas, mas não em fila. Desorganizados, horrorizados.
Ele esperou o Jonas sair de casa. Sabia que o menino não ia perder a festa.
“Qual o problema?” a resposta foi um golpe violento. O cabo de vassoura  partiu-se. E o Jonas caiu. Estela choraria muito. A cidade inteira ia chorar bastante.
Aos quarenta e dois anos decidiu que não queria mais. Deitou no catre da cela, tirou os óculos do rosto e dormiu. Desligou um botão que só ele sabia.
“Morreu” disseram.
Outros dizem que virou livro. Que a biblioteca ficou assombrada. Escutam livros serem folheados e essas coisas.
E uma estranha fila de formigas cortadeiras deu para atacar o acervo. Não há o que mate as danadas.
As vezes elas param e conversam. Dizem que o Nununha sabia o que diziam.


Ronie Von Rosa Martins


quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Endless Love? não, obrigado.




Certa vez vi um filme que tinha como tema central, o amor;
Até aí nenhuma novidade, não é mesmo?
Mas seria um tipo de amor, o amor sem fim.
Obviamente, chamava-se Endless Love...
Acontece que o casal principal não termina junto.
Não porque seu amor tenha acabado; e, sim, devido a uma tragédia.
Mas não vou contar o filme está bem?
Porém, depois de muito tempo, entendi que são as pessoas que tem fim.
E o amor tem fim também. Quando uma pessoa que amávamos deixa de existir.
Não estou falando em morte no sentido literal, mas quando alguém morre só pra nós.
Morre por dentro entende? Deixar de amar é morrer um pouco por dentro.
E assim vamos matando pessoas e seus amores todos os dias.
Somos amantes assassino-masoquistas e vivemos de matar o que sentimos.
Nem estou me referindo à paixão, pois é um sentir mais complicado e efêmero.
Só que agora, antes de atirar-se ao amor, lembramos que somos assassinos de sentimentos.
Ainda bem que tudo tem dois lados e no meu ponto de vista, não mato pessoas.
Mato a mim mesmo. Mato meus sentimentos. O amor que mato é meu, não dos outros.
Seríamos portanto, samurais suicidas praticando uma espécie de “harakiri” egoísta.
E as pessoas não têm fim também não... Tipo, almas, tá ligado?
As pessoas morrem, mas continuam existindo, umas morrem só para nós.
A alma não deixa morrer. Nem a pessoa a qual não se ama mais, tampouco o amor.
Tão pouco o amor...
Por fim, sou um matador. Mato amores de vez em quando.
Mas mato em mim.
Pois o coração é meu.
Às vezes.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Sobre como parar em esquinas



 Há uma música que é só minha. Cérebro – fora o silêncio da rua. O silêncio singular do caos. E um vento. Sopra razoável, rosto, cabelo, terra. Movimento. A carne e o metal disputam os fluxos. Da rua. Ir e vir e estar. Cadáveres de metal esperam a carne, zumbis mecânicos. Devorar a carne humana e seus desejos de mobilidade. Necessidade.
As cores alternam passos e rodas, tudo borracha no asfalto. Largos os passos. Rápidos os espaços de não ficar.
Um aceno. O rosto conhecido me arranca do texto e do asfalto. E passa. Sua vida, tempo e espaço. Eu fico. Finco meu corpo nesta esquina. Imóvel corpo. Estranho aos que escorrem nesse fluxo. Olhos buscam o meu texto. Mas sou eu. O texto. Os pés e os carros minhas palavras. E tudo é símbolo. E som e ritmo.
Por cima a conexão. A aranha tece sua trama. Fios, linhas de relacionamento. E o vento agora. Não há sol. Nublado. E os corpos não param de deslizar na minha imobilidade. E mesmo sozinhas eles se conectam. Músicas escolhidas embalam passos e pernas; o “outro” no ouvido. O fantasma do outro sempre ao lado. Esquizofrenia.
Os óculos escondem os olhos. Só a lente. Esteticamente as lentes. “E eu... gostava tanto de você...”.
Caso certo, interessante. Escrever na rua não é algo comum. Deveria. Sim. Comum é o carro. O zumbi mecânico. E o cão. Rebelde e sujo. Vários. Contrastam com fluxo mecânico. Língua de fora. A língua deve estar fora. Fugir da grande boca gramatical.

Nos corpos as roupas todas, e penduradas nele às bolsas, sacos e sacolas de carregar “coisas” para o corpo. A bagagem do corpo. A maquiagem do corpo. A identidade do corpo. A comida do corpo. A diversão para o corpo. Também há os espaços de guardar e depositar. O corpo e seus desejos. E há as possessões de um corpo pelo outro. A mão segura o outro, afeto e posse. Segurança e controle. Há um contrato. A relação constituída. A experiência dos corpos. Correr e caminhar... é mais que meio-dia e lá vai... o meu corpo no fluxo de todos os outros corpos...


Ronie Von Rosa Martins

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

O menino a chave e o cofre





Uma pequena. Chave de abrir pequenas coisas. Armários, caixas, memórias...
E de papel. O coração da infância. Vetusto coração infantil. Ainda lembrava? Do olho, do cabelo? Não importava. Agora já não importavam os detalhes. Importava o gosto bom. Da infância. O tempo de sofrer e sentir com força. Toda a força do mundo. Tempo de olho brilhante. De coração sensível às cores de todas as sensações.

Lembrava de alguma coisa. Pela fenda que o tempo algumas vezes abria. Voltava. Corria para o passado. Não como fuga. Mas como força. Escorria pelos buracos do passado e lá. Com a chavezinha abria as portas da infância. E voltava guri. Sorrindo.

E lá estava ela.  A menina. Já indefinida. Esfumaçada. Mas ainda bela. Juntos. Carta no cofre. Pequeno cofrinho vermelho. A carta. Rabiscos. Riscos. Emoções em estado primário. Época de cheiros e gostos latentes. Suco de laranja. Melancia, sorvete. Cheiro de terra molhada, de pão feito em casa. Tudo ali. No cofrinho. Guardados. Preservados. Esquecidos?
Nunca. Havia sempre um olhar fugidio pelas ruas. Reconstrução dela. A menina. Cabelos aqui. Um sorriso ali. Os olhos. Nos olhos ele morria. Guri. Perdia a noção do real. Rosto vermelho. Palavras amontoadas que se precipitavam da boca. Gaguejar. Sorriso de bobo. Quando lembrava essas sensações sentia o gosto de picolé-Minissaia. Chocolate e morango.
Até a buzina ouvia. Dentro dos olhos que não via mais. A buzinada, o gosto, a vida.
Os nomes escritos em letras grandes e trêmulas.
E a chave. Em sua mão. O sorriso dela. Era o guardião do segredo. Ele. O senhor do cofre. O coração de papel. Também ele. Guardado. Protegido.
E então o tempo. Vasto e interrupto. E as distâncias. E as outras coisas todas. Tudo se interpondo. Obstáculos. O paladar já não era o mesmo.
Os olhos de não ver infâncias. Quando observava suas fotos atuais, percebia o olho morto do adulto. Olho sem brilho. Olho de ver tudo e nada. Sombrio olho de realidades postas. Na memória o olho brilhava. Cintilava com a intensidade do coração. A estranha sensação da outra mão na sua. A chave. O segredo da infância. Para sempre. A menina sorrindo... se esvaindo em lembranças imprecisas.
O que mais cabia no cofre? O que mais cabia nele mesmo?
Onde andaria a chave? Esquecera. Perdera. Ou jogara fora? Não sabia mais. O que sabia?
Sabia que não era criança. Pretendia. Queria voltar. Subir nas árvores. Tomar banho de chuva. Queria identificar por inteiro o rosto da menininha que brincava de confundir-lhe. Como seria hoje. O tempo...

Os lugares da infância. Não se atrevia mais. Devia estar em um deles. Mas ficaria por lá. Espaços para não-adultos. Cheios de mágica e segredos. O corpo adulto não entenderia. Lugares de aventuras e sensações originais. Lugar de monstros e fadas e demônios. E heróis e amores... 

sábado, 26 de outubro de 2013

O Otimista

                                                                             (por Marcelo Coelho)

          O paternalismo é tolo ao dar o peixe e não ensinar a pescar.  Alheio a lei natural de ação e reação, o Estado investe na ignorância. Na miséria sustentada. A massa, sem raciocínio e ética, se desgarrou.  A tecnologia ajuda o caos. Facilita, acomoda, gera preguiça, simula, dribla a realidade e faz gols contras estéticos. Tolos se enfurnam no subsolo moral em busca de poder, dinheiro, fama, beleza, luxo, potência sexual.  Freud diria que vivemos uma recaída no trauma do materialismo. O hedonismo tem vencido as batalhas sentimentais.

          A mídia sempre foi pervertida. Agora se espraiou. A internet mostra tudo. Sem limites. Nossas perversões ecoam em surround e imagem 7D. Na TV, novelinhas e seriados ensinam tudo de ruim, em doses homeopáticas, feito uma escola bizarra. Os reality shows revelam o sentimento sórdido que move as relações interesseiras. Mulheres com bundas e peitos de plástico, bicos de pato e cérebros atrofiados feito nozes procuram se revirar do avesso e mostrar toda intimidade contida no útero e nos ovários. Os trogloditas do MMA revivem a era dos sangrentos gladiadores e nos mostram a minúscula evolução humana que obtivemos desde a assombrosa idade média.  Heteros e gays também se degladiam pela maior publicidade sobre escolhas que hibernavam nas cavernas do foro estritamente íntimo.

          O poder de crítica das massas foi subestimado. Os telejornais podres realimentam e amplificam o tosco, o tolo, o pior do ser humano. Programas sensacionalistas vegetam na UTI do conteúdo. Teimam em investir na mórbida curiosidade, no falso heroísmo policialesco, no primitivo erotismo formatado ao gosto das maiorias passionais, ou incautas, ou ignorantes, ou deslumbradas com a realidade nua, crua e na brasa.  Só não é guerra civil, porque um dos lados está desarmado. Mas quem leu um pouco de história universal, sabe que tudo sempre pode piorar. Tudo bem. Sigo no meu otimismo. E se me falarem: “Foda-se”, respondo: “Não dá. Duro não dobra e mole não alcança”.


quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Além das Nuvens ou Entre Nuvens e Cavernas

Além das Nuvens
 ou Entre Nuvens e Cavernas

Onde? Do lado de fora da caverna! Logo que saí não me contive. Fui desbravar. O que eram aqueles rabiscos e relevos na rocha? Como foram feitos? Quando? Por que e por quem? Demoraram muitas eras mas conseguimos identificar os caracteres. Uma vontade em compartilhar razões e emoções. E nasceu a linguagem escrita. E Fiat Lux! As ideias brotaram diante dos sentidos. Organizaram-se em mensagem, partiram em caravanas para ligar emissores a receptores. Nem sempre encontraram nexo, sentido, lógica, coerência, sensatez. Mas houve que extraísse a essência, convertesse um novo pensamento, palavra ou ação; para armazenar ou transformar. Quanto movimento evolutivo a leitura oferta na longa jornada do conhecimento!
Mas e a criação individual? Quem de fato detém o saber? O reconhecimento pertence àquele que primeiro registrar a ideia, claro. O que seria da máquina capitalista sem royalties, patentes, direitos autorais? Surge numa inspiração pessoal aleatória ou é uma permissão de acesso aos arquivos acásicos para poucos credenciados? Toda a sabedoria está encerrada no plano das ideias, dizia Platão. Cada escritor, com seu esforço e merecimento alcança algum pedaço ínfimo desse imenso tesouro intangível e tão sublinhado de verdade. E não basta sair da caverna... É necessário coragem para enfurnar-se noutras!

Quantas vezes pensamos em algo interessante. Um verso... Uma melodia... Um conceito... Uma solução... Uma ideia “nova”, que por algum motivo deixamos para lá e não a materializamos ou convertemos em ação. O tempo passa e de alguma forma chega ao nosso conhecimento que alguém teve a mesma ideia, colocou em prática e alcançou o êxito com ela. Você já passou por esta sensação de que alguém teve a mesma sua ideia não foi compartilhada com ninguém? Quando acontece, logo surge a pergunta culposa: “Por que não coloquei essa ideia em prática antes?” Ser ou não ser? O único... O primeiro... O original autor... Especulo que isso acontece porque as ideias flutuam sobre nossas cabeças feito nuvens. Repousam não num minúsculo pedaço de silício, disco, fita, vinil, acetato... Rocha arcaica! Estariam num a inovadora substância não comprovada cientificamente mas apontada por muitas filosofias tão antigas quanto avançadas.  Uma espécie de éter prânico ionizado que nos reveste em camadas como se fôssemos Matrioshkas. Uma invenção do Grande Arquiteto do Universo onde todos os pensamentos ficam gravados com qualidade pra lá de sete dimensões! Espero um dia entender como tal mecanismo físico ocorre. A ciência tecnológica já engatinha na direção certa. A prova é a “nuvem”: Nova forma de armazenamento de dados digitais em rede, desenvolvida por um renomado fabricante de computadores que batizou o novo serviço de iCloud. Aliás... Nome copiado de um produto concorrente. Até tu, Brutus S. Jobs! Lavoisier esteja convosco!

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Dos olhares




Há um olhar configurado. Moderado. Um olhar razoável. Já sem grande brilho nem imagens outras. Olho que vê sem ver. Olho que percebe sem perceber. Olho de ver a imagem comum. Olho de opacidades definidas. Olho de falar e dizer o dizível. Olho .
Há uma forma de ver pesado. Solidez. Olhar de chumbo. Visão de construir muros. E de atrás destes aconchegar-se. Bastar-se. Olho de morrer nos cantos. Falecer.
Há um olho de recortar rostos. De procurar rostos, de escolher rostos. Iguais e mesmos. De excluir também. Tolerar outros. Olho de aceitar o rosto coletivo. Olho de cortar na carne o rosto definível, o rosto aceitável. Olho de padronizar o próprio olho.
Olho que morre no achar-se sábio. Olho que sufoca na concretude de um saber que já não é processo. Saber-estátua. Olho triste que sorri engraçado. Engraçado olho que sorri e é triste. Olho de ver reflexo.
O buraco da parede não é janela. É defeito e problema. Tijolo, cimento. Cego o muro novamente. Proteção. Contenção.
Olho que não arrisca. Nem risca no muro outro desenho que não seja seu próprio olho. Olho de não delirar em cor ou forma. Olho de não inventar palavra e frase. Olho de aceitar.
Olho submisso às imagens, que, como migalhas, lhe são jogadas. Empanturrar-se delas. Diarreia de imagens mesmas.
Olho de não proferir palavra outra. Olho de não devorar o indevorável. Olho de apenas não ver.
Talvez fechar. Cessar esse olho. Apagar a imagem desse olho triste.
Desejar  as imagens outras, para além daquele ver?  Imagens que flutuam no insondável da imaginação e da criação, da realidade e dos encontros que fazemos. Agenciar relações, sentidos, forças, cores, corpos. Atravessar um no outro.
Olho de experimentar vida. Olho de devorar o vivível. Intenso. Vibrante.
Olho de “transver” o mundo. Olho do chão e de sua matéria. Barro.

Ronie Von Rosa Martins




terça-feira, 1 de outubro de 2013

O que se leia

O que se leia


             Cada vez que surge o desafio de escrever sobre algo, se há total liberdade de escolher o tema, isso pode se tornar uma tarefa difícil. Ainda mais considerando a pluralidade de assuntos que circulam pelas mídias. Talvez pouco importe para quem não tem ambições financeiras. Mas pode ser essencial para quem precise persuadir ou, pelo menos, chamar a atenção de uma parcela da população.
           Há, por exemplo, quem dependa da imagem política ou os canais, que precisam levar a publicidade para promover produtos, ideias e pessoas. Talvez bons temas conquistem a atenção, independente da redação ou do trabalho artístico. É que busca o jornalista: o que chamam de matéria é aquilo que geralmente se refere a fatos da realidade. Agora, neste início de setembro, estou assistindo ao filme Repórteres de guerra (2010) do diretor Steven Silver. Esta é uma história real de um grupo de jovens repórteres: Greg Marinovich, João Silva, Kevin Carter e Ken Oosterbroek, que tinham a tarefa de cobrir as primeiras eleições após o fim do regime de Apartheid South Africa. Nesse percurso,  dois deles receberam o prêmio Pulitzer. Um deles foi Kevin Carter pela foto do urubu empreitando uma menina exausta pela fome e a desnutrição. A foto realmente obriga a refletir sobre a condição de miséria, que alguns seres humanos podem chegar. Embora o filme invista bastante no choque emocional dos repórteres aos presenciar condições tão precárias de vida, há o corte narrativo, que torna a comemoração próxima ao evento. A foto de um africano espancado e queimado por seus semelhantes, que também rendeu o prêmio, ocorre o mesmo. Após uma crise emocional do repórter, por ter fotografado e se envolvido em uma situação tão brutal, a comemoração pelo prêmio é mostrada logo em seguida. Assim, não há como não pensar que a miséria de uns pode promover a outros.  Só que neste caso pressupõe-se o choque pessoal por confrontarem-se com uma realidade tão cruel e o castigos por mostrar a verdade.
                  Embora tal crítica provavelmente não se aplique a estes jornalistas, isso tudo faz lembrar dos esses meios de comunicação ávidos por novidades, não pelo valor em si do que é tratado, mas pelo que possam chocar a opinião pública. Esse urubu à espreita pode também se tornar uma metáfora desses que em constante necessidade de chamar atenção se utilizam do que se chama popularmente de apelativo. Há quem se alimente de "verdades" polêmicas. No vídeo "Deputado", produzido pelo do canal Portadosfundos do Youtube, em uma reunião, o deputado com os assessores trata da escolha de um tema impactante que permita ao político voltar para a grande mídia, sob a justificativa já deixara de ser o foco há três semanas, portanto: “A gente tem que atirar pra tudo que é lado”. A discussão começa entre as opções de escolha entre os temas viado, negro, funk, etc. A conclusão que se tira disso tudo é a do tamanho das discrepâncias entre os assuntos tratados por que está no centro e as reais necessidades do povo. Um fato Raimundo Faoro (1998), em A pirâmide e o trapézio, já identificara em textos produzidos por Machado de Assis, já antes do Brasil ser uma república. Também se conclui que para quem atingiu as altas esferas políticas já pode até ignorar a relevância dos temas que defende para a sociedade, desde que pareça importante, por que na sua posição, com assessores pagos pelo Estado, ficou mais fácil manipular a opinião pública. As intenções de expor na mídia a defesa de temas como “O Nazismo teve seus benefícios”, “A AIDS foi uma benção, foi providência divina” podem revelar estratégias de que estar em evidência é suficiente para se reeleger. Pouco importa se cem milhões de pessoas se revoltam com aquilo, se apenas umas duzentas mil se identificarem, isto já é suficiente para eleger a si e a vários “colegas” com a legenda do partido. As vítimas do preconceito, na maioria das vazes, desejam apenas ser deixadas em paz. No entanto, ocorre muito de os veículos de comunicação, por parte daqueles que decidem pelo povo, decidirem o que deve ser pauta de discussão. Ainda querem que se acredite que estão prestando grande serviço discutindo permanentemente as diferenças nas frentes deles.
           No que se refere à literatura, a discussões entre o texto engajado e a “arte pela arte” cruzaram séculos sem uma resposta sobre qual a melhor forma a adotar. Mas o texto literário jamais se limitará a uma função utilitária simplesmente. Até mesmo por que isso dependerá de cada um, da sua relação pessoal com o livro. Nele, a exclusão social, o preconceito ou qualquer tema problemático é tratado numa relação íntima com o leitor. Jamais ocorrerá sob os “holofotes” da mídia, a não ser que a pessoa queira expor suas análises através de blogs ou redes sociais. Dessa forma, através do modelo da fábula, utilizando-se de figuras para tratar de situações humanas importantes, ainda é o melhor meio de proporcionar profundas reflexões, sem com isso agredir ninguém.

            O mesmo pensamento não pode ser aplicado aos grandes meios de comunicação de massa, pois se espera que haja uma função social em seus programas, pois são impostos à população em  horário nobre. Estamos numa época em que as pessoas são ávidas por histórias que de alguma forma sejam supostamente reais, reportagens, investigações, truetv, etc. Mesmo com a consciência que os depoimentos pessoais geralmente são questionáveis, isso não tira o interesse das pessoas. Talvez seja o mesmo que ocorre com os realitys shows, pois mesmo que as “tramas” sejam armadas por um grupo determinado de participantes, ainda conservam a audiência. Portanto, em virtude de programas como estes mencionados ou os que exploram a desgraça alheia, é preciso exigir uma postura mais construtiva, principalmente dos canais de televisão. Segundo Millôr Fernandes, “imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados”. Já no que se refere aos textos para a internet, veículo que hoje concorre com as emissoras de TV na difusão de informações, em meio a milhões de outros, geralmente requer-se um mínimo de relevância social para ser algo “o que se leia”, sem que se seja esse “urubu à espreita”.
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Paulo Fernando da Silva Furtado


sábado, 28 de setembro de 2013

Pensamentos - Daniel Barros

Rio Piratini

Na margem esquerda deste rio, existe uma praia de areias brancas,
No horizonte avermelhado, enxergo nuvens cinzentas.
Os pássaros são motivos de sonhos, pois seu voo é solitário e liberto.
Acontece comigo um raro acontecimento,
O encontro deste simples humano, com o maravilhoso verde do mato.
A natureza é festa, porque finalmente encontrei tempo para este encontro.
Na realidade uma volta a mim mesmo.
Analiso este rio, incorporo-me na paisagem, sinto-me totalmente realizado,
Pois o meu convívio com a natureza é em fraternidade.

Encanta-me esse paraíso. No meio de uma cidade sobrevive um  rio, o qual é usado com integridade.



O desassossego das águas

Um brinde ao remanso calmo das águas deste rio, às vezes amigo, outros cruéis e sem pena.
Quem te vê nessa calmaria, nunca poderá imaginar que às vezes te levanta com selvageria, para aplacar a tua ira.
Procuras vingança pelo mal que te fizeram, mas é pena que em tua loucura atinjas a todos sem querer.
Esta é a lei do mundo, os inocentes pagarem pelos criminosos
Que exploram tuas margens com desatino, derrubando matas, desestruturando o solo.
Abrindo espaços brancos para expansão de tuas águas, invadindo de novo, os campos, cidades e vilas.


Devaneios

Do rugido do cão, das fezes do cidadão,
Do descaso da cidade com a natureza em tenra idade.
Nasceu a poluição, o caos, o fim e a imensidão do negrume, do cheiro de enxofre dos gritos do sofrer, do gemer.
O mundo definhou, o verde acabou e enxergamos  somente a cinza das fábricas  dos capitalistas.
Meu mundo era aceitável, passou a ser explorado, maltratado desmantelado.
O fim é irônico, início de uma nova era, se vai o selvagem, primitivo, e na cidade o bundão vigora.
O homem destrói a vida da mesma maneira que se destrói,
Bebendo, consumindo drogas, acaba se destruindo pelo consumismo total.

Um pileque de vida

Estou passado no tempo, não vivo vegeto.
Encontro-me cansado da noite, do trago, as festas perderam seu sabor, pode até ser minha idade ou meu cansaço mental,
Mas o que acontece na realidade é que eu perdi o meu astral.
Sinceramente invejo aqueles que mesmo velhos e resignados passam por jovens livres de qualquer compromisso.
Somente querem saber de festa, trago escárnio e rebuliço.
Vendem sua alma pela promessa de não perderem um gole da taça da vida.
E com isso sonham acordados que puderam passar a perna no tempo.
Se parassem um pouco para pensar veriam em meus olhos o vazio que habita em seu interior agora.
Já não sabem mais parar, dar um tempo para encontrar seus pensamentos, apenas vigora a lei dos alcoólatras, porque beberam o vinho da vida se viciaram e não conseguem mais serem apenas humanos e realistas e aprenderem que a vida quando ingerida de uma só vez é intragável de mais.



segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Homenagem a "minha escola" e a pessoas admiráveis, nesta minha caminhada...



MINHA ESCOLA

"Meu coração está aos pulos!
Quantas vezes minha esperança será posta à prova? Tudo isso que está aí no ar: malas, cuecas que voam entupidas de dinheiro.

Do meu dinheiro, do nosso dinheiro, Que reservamos duramente para educar os meninos mais pobres que nós. Para cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus pais. Esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais.

Quantas vezes minha esperança vai esperar no cais? É certo que tempos difíceis existem para aperfeiçoar o aprendiz. Mas não é certo que a mentira dos maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz.

Meu coração tá no escuro. A luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó E dos justos que os precederam: “Não roubarás”. “Devolva o lápis do coleguinha”. “Esse apontador não é seu, minha filha”.

Pois bem, se mexeram comigo, Com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, Então agora eu vou sacanear: Mais honesta ainda vou ficar!

Só de sacanagem! Dirão: “Deixa de ser boba, desde Cabral que aqui todo o mundo rouba” E eu vou dizer: “Não importa, será esse o meu carnaval, vou confiar mais e outra vez”. Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos. Vamos pagar limpo a quem a gente deve e receber limpo do nosso freguês.

Com o tempo a gente consegue ser livre, ético e o escambau. Dirão: “É inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de Portugal”. E eu direi: “Não admito, minha esperança é imortal”. E eu repito: “Ouviram? IMORTAL!”

Sei que não dá para mudar o começo Mas, se a gente quiser, Vai dar para mudar o final!

(texto de "Elisa Lucinda" , lido por Ana Carolina em seu show)    

Faço minhas As palavras de Ana Carolina neste desabafo! Pode parecer inocente. "Bestial”, mas se não for por esperança o que será? Há de ter uma luz no final do túnel que não seja um trem...(risadas) Neste momento penso sobre a "EDUCAÇÃO" e então revivo momentos importantes de minha vida profissional. Momentos inesquecíveis...
Resolvi então falar sobre "MINHA ESCOLA".
É... Assim carinhosamente chamada por mim e por aqueles que muito a consideram.
Hoje ela está aniversariando. "CONTANDO TEMPO". Muitos anos se passaram e destes muitos anos, 21 deles mais ou menos eu vivi ai... Todos os dias. Dias de muita batalha, mas de muita esperança.
Nesta Escola com certeza eu muito mais aprendi do que ensinei. Tornei-me uma pessoa diferente... Não sei se uma pessoa melhor ou pior. Que julguem os outros... (risadas) Mas de uma coisa tenho certeza: É que conquistei - e é o que me dá certeza de que valeu e que vale a pena - a amizade de meus ex-alunos. Amizades para sempre. Carinho que ainda hoje vejo refletir nos olhos de cada um quando nos encontramos. É... Eu ainda falo de olhos... (risadas) de amor, de carinho... Resolvi que vou morrer assim... Acreditando... Tenho esperança e sobretudo muita fé!...
Obrigada a todos os meus alunos queridos. Guardo-os cada um do seu jeito em meu coração... Esta Escola é... Foi e será sempre a nossa escola. E é só por vocês que eu ainda estou aqui falando e tendo fé nesta arte chamada “Educação”. Parabéns!!
E sem ser "Demagoga" amo todos vocês!!! Vocês são a "ESCOLA MUNICIPAL GETÚLIO VARGAS". Vocês são a "Esperança"... E minha esperança é imortal, minha fé inabalável.
É dia de festa e eu gostaria de agradecer e fazer um registro sobre a importância de algumas pessoas - e através destas figuras agradecer todas as coisa boas que vivi nesta escola. - Um anjo bom que até hoje me acompanha é o "Arobaldo " com seu sorriso infantil.. Inocente. Olhos brilhantes de tanta pureza e amor. É... "Olhos são muito importantes...” Sua voz doce que me chamava de "Rubis"... Um mestre! Um amigo que jamais vou esquecer... AMIGO DE VERDADE!
O meu aluno Roger... quero nele, lembrar todos os outros e vou falar de " olhos"...(novamente)...aqueles olhinhos inquietos, humildes e cheios de indagações... Sempre tinha uma pergunta inteligente, sempre queria saber mais...
Obrigada Roger e Arobaldo por terem existido em minha vida... Obrigada pai do céu por me oportunizar a companhia destas pessoas tão especiais. Acredito que se comemoramos o aniversário da Escola municipal Getúlio Vargas, estas são pessoas que deveriam ser lembradas. Gostaria também de agradecer e lembrar a Professora Maria Brandina que - na minha opinião - foi uma guerreira, alguém que sempre pensou no crescimento e no bem estar de "Nossa escola e de nossos alunos". A professora Arlete Xavier, colega dedicada, professora exemplar, alguém que sempre buscou a justiça e a igualdade. Que Deus nos ilumine e proteja..."EDUCAR É UM DOM"...aprender...um processo contínuo.....



Mara Rubia Martins





 A professora Mara Rubia Martins foi vice-diretora no ano de 1997 e diretora no ano de 1998. Em 1999 foi reeleita diretora até 2000. Em 2003 foi vice-diretora novamente e em 2004 assumiu a direção mais uma vez. 




Postado por gvmcatavento às 12:09 1 comentários Links para esta postagem

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